segunda-feira, 25 de março de 2013

PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL

Ao lado das regras, os princípios formam o conjunto das normas jurídicas, e a partir dos princípios e das regras são formadas as normas legais.

Abaixo segue esquema que diferencia princípios e regras:


Princípios
Regras
São a expressão de valores ou ideais
Contêm a regulação de comportamentos, o que é permitido, exigido ou proibido à pessoa
São escritos através dos enunciados de valores e ideais
São a descrição de condutas e das consequências destas
São dotados de elevada abstração, de modo que várias interpretações sejam formadas a partir de um único princípio
Possuem maior concreção, de modo a não permitir um grande número de interpretações
Possuem maior hierarquia
Possuem hierarquia menor

PRINCÍPIO BASILARES

Os princípios basilares são a essência do Direito Penal, de modo que os demais princípios decorrem destes. Pode-se dizer que os princípios basilares são o núcleo, o coração dos princípios, de modo que os princípios basilares servem de modelo, de inspiração, aos demais princípios. Já as regras têm por base a interpretação conjunta dos princípios.
São os seguintes os princípios basilares do Direito Penal:

  • Principio da dignidade da pessoa humana
  • Princípio da legalidade
  • Princípio da culpabilidade

Principio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III da CF/88)

É fundamento da República Federativa do Brasil, senão vejamos:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;

Segundo Canotilho esse princípio resulta numa concepção antropocêntrica do Estado, de modo que o homem é o centro gravitacional do país, que o Estado está a serviço do cidadão.
O conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana deve ser encontrado mediante a interpretação sistemática da Constituição.
O referido princípio pode ser vislumbrado tanto no crime quanto na pena.
Com relação ao crime, o princípio veda a incriminação de condutas socialmente inofensivas. Assim o legislador penal não pode usar a lei de forma tirânica, de modo a incriminar comportamentos que não estejam revestidos de ofensividade, que não produzam qualquer dano ou perigo de dano, ou em outras palavras, não será legítimo o legislador incriminar condutas que sejam apenas imorais ou contra o sentimento religioso. Para a conduta ser penalizada deverá apresenta, no mínimo, risco de produção de dano.
Quanto à pena, o princípio veda a aplicação de penas cruéis, degradantes ou vexatórias. Então proíbe-se a aplicação de penas perpétuas ou penas corporais. Tal princípio encontra respaldo na Carta Cidadã, conforme pode ser visto do seu art. 5º, inciso XLVII:

XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;

O RDD viola o princípio da dignidade humana? Não, pois não constitui pena cruel e está de acordo com a Constituição Federal, que autoriza o encarceramento como pena criminal, no art. 5º, inciso XLVI.


Princípio da legalidade


Não há crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal.

Origem histórica: Carta Magna de 1215, documento imposto pelos nobres ingleses ao Rei João sem Terra.Porém, somente foi incorporado ao Direito Penal, de fato, quando foi apresentada a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, na Revolução Francesa, com base na idéias iluministas.
O primeiro diploma legal a disciplinar o princípio foi o Código Penal Francês em 1810. No Brasil ele foi disciplinado na Constituição do império em 1824 e no Código Criminal de 1830.
Atualmente encontra-se disciplinado na CF/88 em seu art. 5º, inciso XXXIX e no Código Penal em sei art. 1º, conforme pode ser visto abaixo:

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

O princípio da legalidade contêm em seu enunciado dois sub-princípios, quais sejam os princípios da reserva legal e da anterioridade.
O referido princípio visa garantir a segurança jurídica, de modo que caso seja realizado ato não proibido por lei o indivíduo não pode ser punido. Assim, o cidadão não pode ser punido se praticou, antes da elaboração da lei, ato que posteriormente foi definido como crime.
Decorre do princípio em questão que deva haver lei em sentido forma, ou seja, escrita e elaborada conforme as determinações legais, afastando-se os costumes como forma de incriminação penal, ou seja ou costumes não podem fundamentar incriminações ou agravar aquelas já existentes.
Deve-se atentar que o costume não está banido do direito penal, podendo-se ser utilizado, excepcionalmente, como elemento de incriminação. Ex. crime de ato obsceno. É certo que o conceito de ato obsceno não é o mesmo que se concebia na década de 1940, quando da criação do Código Penal.
O costume também pode atuar como fonte de normas penais permissivas. Ex. trotes acadêmicos, na qual os veteranos praticam atos de injúria, constrangimento ilegal, entre outros, de modo que se não houver excesso a conduta será lícita.
Analogia – cuida-se de método de integração do ordenamento jurídico, isto é, de preenchimento de lacunas, no qual se aplica uma regra vigente para solucionar o caso não previsto em lei. É possível analogia in bonan parten, porém a analogia in malan parten é proibida. Exemplo de analogia in malan parten é o furto de sinal de TV a cabo, que é considerado, pelo pensamento dominante, conduta atípica.
Importante frisar que segundo o princípio da legalidade a lei deve ser elaborada por órgão competente, no caso brasileiro somente está autorizada a União a legislar sobre direito Penal, excetuando-se do caso de Lei Complementar da União transferindo a competência legislativa penal para os Estado para que sejam elaboradas lei específicas.

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
Assim, deve ser elaborada, via de regra, Lei Ordinária e, excepcionalmente, Lei Complementar. Deve-se atentar que a CF/88 proíbe a edição de Medidas Provisórias em matéria Penal, conforme art. 62, §1º, aliena “b”.

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:

I - relativa a:
(...)
b) direito penal, processual penal e processual civil;

Atenção! Ocorre, porém, que normas benéficas podem ser elaboradas por meio de Medida Provisória, de modo excepcional, desde que seja convertido em lei, conforme ocorreu com relação à extinção da punibilidade em relação à entrega voluntária de arma.
O Decreto-Lei pode ser fonte normativa, desde que tenha sido elaborado antes da CF/88 e tenha sido recepcionado.
Devido à lege praevia, ou anterioridade deve-se entender que ninguém pode ser punido por fato praticado antes da entrada em vigor da lei penal.
Questão importante é a da medida de segurança, que não é considerada pena, o que pode levar ao questionamento se poderá ser aplicada medida de segurança por fato incriminado após a prática da conduta. Deve-se atentar que todos os princípios constitucionais do Direito Penal aplicam-se apena e à medida de segurança, assim não poderá ser aplicada medida de segurança a fato não definido como lei quando da sua prática.
Por lege certa ou taxatividade, deve ser entendido que não serão aceitos termos ambíguos, vagos, de conteúdo indeterminado, nas leis penais. A lei penal deve possuir conteúdo determinado, vedando-se os tipos penais vagos.
Saliente-se que tipo vago não deve ser confundido com crime vago. No primeiro o conteúdo da lei é indeterminado, já o crime vago é aquele cujo sujeito passivo é um ente sem personalidade jurídica, por exemplo, crimes contra a família. Frise-se que diferente do tipo vago, o crime vago é, indubitavelmente, constitucional.
Também não deve-se confundir tipo penal vago com tipo aberto é o que possui amplo alcance, abrangendo um número elevado de condutas humanas, mas possui conteúdo determinado. O tipo penal aberto abrange um grande leque de condutas possíveis, há diversos modos de execução da conduta.


Princípio da Culpabilidade


Não há responsabilidade penal sem culpabilidade.

Segundo parte da doutrina não há crime sem culpabilidade (nullum crimen sine culpa). Outra parcela da doutrina diz que não há pena sem culpa (nulla poenasine culpa). A primeira corrente pertence aos adeptos da teoria tripartida, que diz que culpa é requisito do crime, já a segunda corrente é adepta da corrente bipartida, que alega que a culpa é pressuposto do crime.
O fundamento constitucional do princípio da culpabilidade encontra-se no art. 5, inciso LVII da CF/88. Esse dispositivo diz que a pessoa somente será considerada culpada após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, é o princípio da presunção da inocência, estado de inocência ou princípio da não culpabilidade. Deriva desse princípio que uma pessoa somente poderá ser condenada se agir com culpabilidade.

São conseqüência do princípio em questão:

- Não há responsabilidade penal sem dolo ou culpa, ou vedação da responsabilidade penal objetiva. Ou seja, não pode ser considerado culpado a agente que teve mera voluntariedade do ato, de modo que é inaplicável a versari in re illicita. De modo que o art. 3º da Lei de Contravenções não foi recepcionado pela atual Constituição, pois se trata de exemplo de versari in re illicita.
Obs. A concepção atual de culpabilidade considera que o dolo e a culpa não são seus elementos. Por esse motivo, é melhor se referir à proibição de responsabilidade penal objetiva como princípio da responsabilidade penal subjetiva.

- A responsabilidade penal exige a presença dos elementos da culpabilidade. Quais sejam, imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e potencial consciência da ilicitude.

- A responsabilidade penal deve ter como base a gravidade do fato cometido, ou seja, quanto mais grave o fato maior deve ser a pena.

PRINCÍPIOS DERIVADOS OU DECORRENTES


Princípio da retroatividade benéfica da lei penal.

A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

O princípio em questão baseia-se no art. 5º, inciso XL da CF/88 e no art. 2º do CP.
Art. 5º
(...)
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

Esse princípio atinge até mesmo a coisa julgada.


Princípio da insignificância


Condutas que produzam lesões insignificantes aos bens juridicamente tutelados são consideradas (materialmente) atípicas.
Tipicidade material é a lesão ou perigo de lesão ao bem juridicamente tutelado
A insignificância conduz à atipicidade material da conduta. Isso que dizer que mesmo que a conduta se enquadre no tipo penal ela não poderá ser punida, visto que não apresenta lesão juridicamente relevante ao bem juridicamente tutelado.
Segundo o STF devem ser examinadas as seguintes diretrizes para aplicação do princípio da insignificância:

- Reduzida periculosidade social da ação;
- Baixo grau de reprovabilidade da conduta;
- Ínfima lesão ao bem jurídico; e
- Ausência de ofensividade.

Para aplicação do princípio também deve ser observada a eventual primariedade do agente, isso porque não deve ser admitido o princípio em questão às pessoas que fazem do crime o seu meio de vida.
Aplica-se o princípio a crimes definidos na lei anti-drogas? Não, uma vez que o bem jurídico protegido é a saúde pública.
Aplica-se a crimes contra a administração pública? Via de regra, não, pois tais delitos não tutelam somente o erário, mas também a moralidade e a probidade administrativas. Atente-se que um crime de peculato por furto de objeto de valor ínfimo, como, por exemplo, uma caneta, não justifica a persecução penal.
No caso de descaminho (334 do CP) é aplicado o princípio da insignificância quando o valor do tributo e acessórios não ultrapassa R$ 10.000,00 (dez mil reais). Isso ocorre porque a União autoriza a fazenda a não executar ação fiscal por valores menores do que 10.000,00 (dez mil reais), de modo que senão há cobrança fiscal não deve haver persecução penal. No caso, o princípio que deve ser aplicado é o da subsidiariedade do Direito Penal, visto que o Direito Penal é a ultima ratio.


Princípio da adequação social


Condutas socialmente adequadas devem ser consideradas penalmente atípicas. Ou seja, o Direito Penal deve punir o que é inadequado à vida social, não se justificando punir condutas adequadas socialmente.
Importante frisar que não se pode confundir leniência com adequação social. Como exemplos podemos citar o caso de casas de prostituição (229 do CP), jogos de azar ou jogo do bixo, violação de direitos autorais (184 do CP). Em todos esses casos o STF e o STJ rechaçaram o princípio da adequação social.


Princípio da alteridade


O Direito Penal deve punir somente condutas que produzam lesões a bens alheios, ou seja, a conduta deve ter periculosidade para bens jurídicos alheios. Lesões a bens próprios não podem ser criminalizadas.
Atente-se que no caso da auto-lesão visando fraudar seguro deve ser entendido como crime tipificado no art. 171, § 2º, inciso V do CP, senão vejamos:
Estelionato

Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
(...)
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:
(…)

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro;

Com relação ao consumo de drogas, não deve ser punido, pois a pessoa só faz mal a si mesmo. O que se pune é o porte, segundo o art. 28 da Lei 11.343/2006, pois o que está em risco é a potencialidade de circulação da droga, que poderia violar a saúde pública.
Também não pode ser punível a tentativa do suicídio, visto que o suicida apenas lesa bem jurídico a ele pertencente.


Princípio da subsidiariedade


O Direito Penal deve atuar como ultima ratio, ou seja, somente deve ser utilizado quando os demais ramos jurídicos não derem solução adequada ao comportamento ilícito.
Pode-se definir como exemplo o revogado crime de adultério, tipificado no art. 240 do CP, visto que tal crime poderia ser melhor resolvido por outro ramo do Direito, qual seja, o Direito Civil.


Princípio da ofensividade ou lesividade


Não há crime sem efetiva lesão ou perigo concreto ao bem juridicamente tutelado. Nullum crimen sine injuria.
Há grande aceitação doutrinária, porém não encontra abrigo na jurisprudência pátria.
Pelo princípio, vedam-se crimes de perigo abstrato ou presumido. Como solução o que deve-se exigir é a demonstração de perigo concreto em todo crime de perigo.

Devemos atentar, para melhor compreensão do tópico, a classificação dos crimes, no que tange ao resultado jurídico:
- Crimes de lesão – são aqueles que consumam-se apenas com a efetiva lesão ao bem tutelado;
- Crimes de perigo (ameaça) – Sua consumação se dá com a exposição do bem tutelado a uma situação de risco ou perigo. Ex. art. 132 do CP (periclitação da vida ou saúde alheia), para a tipificação do crime em questão basta que se tenha colocado em risco a vida ou integridade física alheia.

1. Perigo concreto (real) – o perigo figura como elementar do tipo e, portanto, exige efetiva comprovação
2. Perigo abstrato (presumido) – não figura como elementar do tipo, pois o legislador presume que a conduta é por si só perigosa. Ex. embriaguês ao volante


Importante enfatizar que no STJ e STF prevalece a validade dos crimes de perigo abstrato.


Fonte: Professor André Stefam

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